sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Entre Contos e Versos * Maxilane Martins Dias - AC

Entre Contos e Versos

A menina Haida e o papagaio
(Por Maxilane Martins Dias)
Era uma vez um papagaio muito valente de nome Papagagio.
Ele fugiu da Papagolândia, pois estava entediado de participar no UFCucogaio Combate. Ele era o mega campeão, aparecia em muitas tevês e participava em muitos comerciais, divulgando uma infinidade de artigos esportivos, cadernos, mochilas, blusas, tênis, e muitos outros produtos.
Como era adepto de uma alimentação saudável, havia uma variedade de alimentos com o nome dele, principalmente, alimentos em grãos, tipo soja e milho.
Eram tantos holofotes e eventos para participar que Papagagio não tinha mais tempo para ele, para fazer coisas de que gostava, como: ler um bom livro de histórias, jogar xadrez, ir ao cinema e ficar no alto de uma árvore apreciando a paisagem e cortando folhas e mastigando sementes.
  Na fuga ele foi parar numa casa com o quintal arborizado e era, justamente, a casa da menina Haida.
Quando a menina viu o papagaio em sua árvore de brincar, ficou muito feliz. Fazia tempo que ela queria um bichinho de estimação, mas ela não queria um bichinho que todo mundo tinha, tipo um cachorro ou gato. 
Papagaio já é mais difícil, nem todo mundo tem, principalmente, um lindo papagaio estrela.
Assim, quando a menina viu o papagaio, seus lindos e graúdos olhos negros brilharam. 
Papagagio também arregalou seus olhos já arregalados.
Foi um amor à primeira vista!
Depois desse encontro, para onde a menina ia, levava seu papagaio.
Se fosse passear na rua, se fosse à casa de alguma amiga, se fosse brincar na casa da árvore e fosse passear na praça, levava o papagaio.
Às vezes, até no cinema a menina levava o papagaio. Ele gostava tanto de cinema que ficava de olhos vidrados na telona comendo pipoca, depois era capaz de repetir todas as falas, e isso era muito engraçado.
Às vezes, ela levava ao supermercado, à seção dos doces, e ele gostava muito de comer chocolate amargo com ela.
Só havia um lugar em que a menina, ainda, não havia levado o papagaio, até por que não podia. Esse lugar era a escola.
Mas, a menina já havia falado tanto do papagaio, de como ele era esperto e bonito que todos da turma queriam conhecê-lo, menos uma menina marrenta, grande, forte e feia, que todos tinham medo. Ela já tinha quinze anos, e ainda, cursava o quinto ano e tinha sido transferida de duas escolas por mau comportamento.
Essa menina era tão feia que quando apareceu na porta de sala, um menino apelidado de “Miudinho” que pensou que ela fosse um desses alunos lunáticos que têm por aí, que entram na escola, dando tiros em quem veem pela frente. Ele ficou tão apavorado ao pensar nisso, que correu e se enfiou embaixo da mesa da professora.
Esse não foi um caso isolado. O medo da cara feia da nova menina se espalhou na turma, de maneira que quando ela pedia algo emprestado, ninguém negava. De início, a intenção da turma era ajudar e ser solidária, mas o problema era que a menina não devolvia o que pedia emprestado e ninguém tinha coragem de cobrar.
Muitos já tinham ficado sem o grafite ou a caneta que mais gostava.
Aquilo já era um caso de polícia! Roubo na cara feia! Mas, a turma deixava por menos.
(Vou deixar de falar dessa menina, senão vou ocupar toda a história só com ela).
Conforme vinha contando, a escola era um dos poucos lugares em que Haida ainda não tinha levado seu papagaio estrela a quem dera o nome de Cristiano ou “Cris”, pois ela adorava o jogador CR7 (Cristiano Ronaldo).
Um dia, de tanto pedirem, a menina levou o Cristiano para a escola.
Todos queriam pegar, acariciar as penas, beijar e abraçar Cristiano, de tão belo que era.
Então, aconteceu algo que ninguém imaginava. A menina “cara feia” pediu para segurar o Cristiano.
Ela começou a acariciar as penas de Cristiano, mas, depois de sorrir com os dentes trincados, começou a apertar...
- Cuidado, você tá machucando ele! – gritou Haida.
Todos os colegas ficaram apreensivos.
A intenção da menina era sufocar o Cristiano.
Ele como mega campeão que era de UFCucogaio Combate, desvencilhou-se do aperto e deu tantas bicadas na malvada que ela chorou feito a um bebezinho.
Ela ficou com a mão tão machucada que não pôde escrever por uma semana.
Depois disso, ela deixou de pedir o material dos colegas e tá até sorrindo.
  E não é difícil imaginar que o papagaio Cristiano foi mais paparicado por todos.
Certa noite, os empresários agenciadores de Papagagio apareceram e ele teve que retornar a Papagolândia, mas passou a fazer apenas aquilo que lhe deixava feliz.
Quando a menina Haida acordou e não viu mais o Cristiano, ficou triste. Mas, ela sabia que um dia isso iria acontecer, e guardou-o para sempre em suas lembranças.
(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, Rio Branco – Acre, 20/01/2020). 


Capi, a capivara
(Por Maxilane Martins Dias)
Capi acordou cedo em mais um dia de sol.
Resolveu fazer seu desjejum à beira do lago, comendo a deliciosa relva verde.
Ela se sentia um pouco estranha àquela manhã, mas não sabia o motivo.
Capi já era uma capivara adulta e estava na hora de ter uma família.
Ela obsevou um belo capivara que pastava próximo e enamorou-se dele.
Foram dar um passeio que demorou uns quatro meses, quando apareceu no verão estava com dois pequenos filhotes, muito fofos.
  Capi gostava muito de ficar naquele lugar, agora com os dois filhotes. Ela tinha a relva verde deliciosa, tinha a sombra das árvores, tinha o lago para se refrescar, e tinha sempre muita gente caminhando, pessoas boas que respeitavam a ela e aos filhotes.
Ela gostava muito de pastar perto das pessoas e ficar atenta às conversas.
Não pensem mal dela. Ela não era uma capivara fofoqueira, que gostava de saber da vida dos outros. Não é isso!
Ela achava as conversas muito divertidas e inteligentes, por isso, ficava atenta.
Capi gostava daquele lugar também, porque tinha muitos amigos. Tinha as outras capivaras, tinha as garças, os jacarés, os peixes do lago, os pássaros que passavam por ali para descansar e refrescar o bico.
O tucano Tuca que sempre parava por ali para pôr a conversa em dia.
A sabiá Sabida, que contava cada caso. Certa vez, ela contou que meteu a colher, a concha e a escumadeira na briga de ciúmes de dona Pom com o senhor Pom. Ele, coitado! Teve que dormir fora do pombal ao relento. Ela não aguentou e defendeu o senhor Pom, ele era inocente.
Nas tardinhas em que passava comendo grama com a família Capi observou que os bichos dali, também, tinham uma conversa inteligente e eram sempre muito educados.
Ela está pensando em fazer um curso. Você poderia indicar um para ela? Ela ia gostar muito.
Capi  é uma capivara que mora no campus da UFAC – Universidade Federal do Acre. Vai lá visitá-la e depois me conta.
(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda. Membro da SLA – Sociedade Literária Acreana. Rio Branco – Acre, 19/01/2020).


*Acalenta Noite*

Acalenta noite
Meu olhar perdido
Nesse negrume
Onde os pensamentos
Vicejam
Viajam
Em busca de agasalho.

Acalenta noite
Meu inquieto coração
Que por ti,
Somente,
Por ti,
Palpita,
Descompassado.
(Para um amor distante).

Acalenta noite
Meu sono
Que meus
Sonhos tragam
Tua exuberante
Presença
Em amor
E êxtase.

Acalenta noite
No cintilar do luar
E no tilintar dos astros
Memórias da
Minha querida
Infância.

Acalenta noite
O trafegar de vidas
Desvalidas
Cambaleantes
Na cidadela
Desalmada.

Acalenta noite
O choro de bebês
Ao colo
De pais
Em busca
Do acalantar
Maternal/Paternal.

Acalenta noite
Vidas sofridas
De injustiçados
Dessa vil
Sociedade.

Acalenta noite
Vidas
Desfalecidas
E mortificadas
Ao crepúsculo
Esquecidas.

Acalenta noite
Vidas perdidas
Na violência
E nas várias
Ocorrências.

Acalenta noite
A quem busca
A paz
De um amor
Fugaz.

Acalenta noite
Todos que
Choram
Pranteiam
Com sofrimentos
Da vida.

Acalenta noite
Os pais
Do filho
Perdido
Do filho
Que partiu
Que desse mundo
Sumiu.
(Por favor, acalenta “Pai”).

Acalenta noite
Os amantes
Os namorados
Consumidos
Pelo fogo
Da paixão
Ou da traição.

Acalenta noite
O indigente
O morador de rua
O mendigo
Pois eles,
Também,
São gente.

Acalenta noite
O órfão
O abandonado
Os assombrados
Pela fatalidade
Pois, todos eles, merecem
A felicidade.

Acalenta noite
O oprimido
O desvalido
O desassistido
Pois, também,
São filhos,
De Deus.

Acalenta noite
A todos
Desse meu lamento
Em audição,
Pois, é oração.
Amém!...

(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, 21/01/2020).


*Essência de Pássaro*

Abres tuas asas
E voa em direção
Ao horizonte
Rumo ao infinito.

Tua plumagem
Alva como
Os altos picos nevados
Reluz
Ao despertar da aurora.

Tuas fortes
E perenes asas,
Permanecem,
De movimentos
Constantes,
Sublimando liberdade!

(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, 27/01/2020).

*Natureza Morta!*

A Natureza clama por ajuda
Existe morte a espreitar o ser
Plantas e animais,
Perecem, deixando de ser.
A vida se esvai no crepitar
Das chamas.
Ô homem?! O que fizestes?
Sem pensar no próximo,
E em ti mesmo,
Trouxestes teu fim!
O que dita o ritmo dessa destruição?
Tua loucura ou tua ganância?
Brevemente, não haverá espaço,
Nem pra um nem pra outro.
Queria dizer que recobrastes o juízo,
Mas, já é em vão,
Pois construístes teu fim:
É o fim das matas ciliares,
É o fim dos mananciais,
É o fim dos igarapés,
D’águas límpidas e frescas,
Revigorantes e revitalizadoras da vida.
É o fim de animais
Que se extinguem,
 Como a suave brisa,
Restando o pesar e a dor
Dilacerante do fim da vida...
Ô homem, o que queres?
Conseguistes a destruição
Da mais imperiosa e linda floresta:
A Amazônia!
Riqueza do Brasil
E patrimônio da humanidade.
Nossa linda floresta arde,
Incendeia ao descaso
Do pouco caso
E não do acaso.
Si eu que estou aqui sofro,
Imagina quem dela apenas sonha...
Sejamos grandes,
Mas sejamos maiores,
Em preservar a tua,
A minha,
As nossas vidas!
Sejamos criadores de vida,
E não, ceifadores (semeadores) de morte.
Reflito apenas...
Em aflição...

(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, 27/01/2020). 

O Que Quero Pra “Minha Cidade”

Quero a liberdade de ter trabalho,
De poder ganhar, sem fazer apenas um “quebra-galho”.
Quero liberdade de poder todo dia comer,
Sem mendigar, sem esmorecer. 
Quero liberdade de poder com qualidade estudar,
Pra minha vida, dignamente poder continuar (mudar).
Quero liberdade de caminhar em minha cidade,
Sem medo da minha infelicidade.
Quero andar nos parques sentindo a fragrância das flores,
Sem presenciar ou ser vítima de quaisquer horrores.
Quero minha cidade limpa e bela,
Sem ter que ouvi ou sentir, o estampido de “bala”.
Quero um sistema de saúde eficiente e eficaz,
Pra me sentir acolhido e em paz.
Quero ver minha cidade livre de corrupção,
Longe de administrador ruim e político ladrão.
Quero viver na cidade sem ter que fugir do alagamento,
Pra que a vida não seja um lamento.
Quero o direto de ter, sobretudo, de usufruir,
Sem ter que pedir pra sumir.
Quero tudo e não quero nada,
Quando nada é tudo e tudo é nada.
Quero viver nesse mundo ouvindo relatos de alegrias,
E não apenas histórias de sangrias.
Não quero ouvi que essa cidade ainda não existe,
Pois é nela que eu e, você persiste (vive).
Quero apenas a minha liberdade,
Livre de qualquer impunidade.

(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, 27/01/2020).


O Trem da Vida (Reflexão)

O trem vinha chegando...

O trem vinha chegando
Com aquela sua cantiga:
“Morre o velho e nasce o moço!”

Quando soltava labaredas nos trilhos
E toneladas de fumaça no ar,
Vinha a toda velocidade, vociferando.
Esbravejava:
“Morre o velho e nasce o moço!”

Quando o trem calmo estava,
Sobre os trilhos deslizava,
Com retidão anunciava:
“Mor-re o ve-lho e nas-ce o mo-ço!”

Era nele que todos chegavam...
Era nele que todos partiam...
Anunciando saudades e despedidas findas.
“Morre o velho e nasce o moço!”

Sem aquele trem, não se tinha alegrias.
Não se tinha o pulsar da vida.
Não se tinha a vida a findar.
“Morre o velho e nasce o moço!”

Do trem surgiam sonhos
E também partiam voos...
“Morre o velho e nasce o moço!”

Com o trem vinham quimeras
De casamentos e faculdades,
Deslumbramentos de romances,
Também, vinham decepções de amores perdidos,
Vinham ganhos e perdas imensuráveis!
“Morre o velho e nasce o moço!”

Ninguém do trem fugia
Ora velho!
Ora moço!
Ora ve-lho...
Ora mo-ço...
“Morre o velho e nasce o moço!”

Lá estava o trem a passar
Com seu repente:
“Morre o velho e nasce o moço!”
“Mor-re o ve-lho e nas-ce o mo-ço!”

O trem trazia amizades
O trem trazia fulgor
O trem trazia calamidades
O trem trazia furor
Sempre com seu cantar:
“Morre o velho e nasce o moço!”

Sobre muitos se abatera:
Um dilúvio
Duas Grandes Guerras
Uma Hiroshima e Nagasaki
Um 11 de Setembro
Um Golpe de Estado (Brasil, 1964)
Um Holocausto, ...
Sempre o cantar lúgubre: 
“Morre o velho e nasce o moço!”

O trem não se detém:
Passa dia
Passa noite
Passa ano
Passa década
Passa século
Passa milênio
“Morre o velho e nasce o moço!”

Findam-se os embarques
Findam-se as viagens
Mas o trem não se detém nunca
“Morre o velho e nasce o moço!”

Nunca tantos embarques e desembarques,
Em pleno século XXI:
São filhos
São pais
São mães
São genros
São noras
São sogros
São tios
São avós
São netos
São homens
São mulheres
São crianças
São tantos...
E o trem a repetir:
“Morre o velho e nasce o moço!”

Nesse trem já embarcamos
O que fazemos é buscar,
Ao máximo, o desembarque retardar.

O Trem da Vida soa assim:
“Morre o velho e nasce o moço!”
“Morre o velho e nasce o moço!”
“Morre o velho e nasce o moço!”

“Morre o velho  e nasce o novo!...”

(Maxilane Martins Dias, pai de Pedro Henrik e de Maria Eduarda, membro da SLA – Sociedade Literária Acreana, Rio Branco – Acre, 14 de setembro de 2019).


Pequena Biografia:
Maxilane Martins Dias. Graduado em Pedagogia pela UFAC – Universidade Federal do Acre (1997), com especialização em Literatura Infantil, pela mesma universidade (2004). Autor dos livros: “Horácio: o burrinho aventureiro”, pela Chiado editora (2018); e “Cachinhos de Uva e os Três Ursos” e “A menina que roubava”, ambos pela Kazuá editora (2018). Apreciador da literatura em geral e natural do estado do Acre.
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